segunda-feira, 15 de outubro de 2012

Carmelitas, amigos de Deus


O texto a seguir é um resumo da manhã de espiritualidade carmelitana conferida por mim à Ordem Terceira do Carmo de João Pessoa (13.10.2012). Tratarei da amizade apresentando um conceito e o aplicando a Deus, tendo como base a Sagrada Escritura, e ao ser humano, tendo como base os ensinamentos de Santa Teresa de Jesus.

O QUE É AMIZADE?
A amizade é um relacionamento humano que se baseia na comunicação, na interação das pessoas, e que envolve o conhecimento mútuo, a confiança, o apoio, a compreensão, o sacrifício, a estima e o amor.

JESUS, NOSSO AMIGO.
Na Sagrada Escritura, Deus se revela como um amigo; é da boca de Jesus que ouvimos:
“Já não vos chamo servos, porque o servo não sabe o que faz o seu Senhor. Eu vos chamo amigos, porque vos dei a conhecer tudo o que ouvi de meu Pai” (Jo 15,15)

DEUS, AMIGO?
Embora falemos de Deus como amigo, talvez não aprofundemos o alcance dessa afirmação. Para um crente, ver Deus como amigo, é encontrar n’Ele tudo aquilo que desejamos encontrar em uma amizade:
1-  comunicação  2- conhecimento 3- confiança
4- fidelidade 5- apoio, ajuda, sacrifício 6- afeição, amor.

A AMIZADE DE DEUS NA SAGRADA ESCRITURA

Repassando alguns textos da Bíblia, percebemos, da parte de Deus, a vivência dessas características essenciais à amizade:
Comunicação: Deus nunca deixou de se comunicar com a humanidade:
- “Muitas vezes e de diversos modos outrora falou Deus aos nossos pais pelos profetas. Ultimamente nos falou por seu Filho, que constituiu herdeiro universal, pelo qual criou todas as coisas” (Hebreus 1,1-2)
- “E o Verbo (a Palavra) se fez carne e habitou entre nós.” (Jo 1,14)
Conhecimento: Deus nos conhece.
- “Senhor, vós me perscrutais e me conheceis, sabeis tudo de mim, quando me sento ou me levanto. De longe penetrais meus pensamentos.  Quando ando e quando repouso, vós me vedes, observais todos os meus passos.
A palavra ainda me não chegou à língua, e já, Senhor, a conheceis toda. Vós me cercais por trás e pela frente, e estendeis sobre mim a vossa mão. Conhecimento assim maravilhoso me ultrapassa, ele é tão sublime que não posso atingi-lo” (Salmos 139,1-6).

Confiança: Deus confia no ser humano
- “Vós sois o sal da terra (...) Vós sois a luz do mundo (...) . “Assim, brilhe vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem vosso Pai que está nos céus”. (Mt 5, 13-14.16)
- “Toda autoridade me foi dada no céu e na terra. Ide, pois, e ensinai a todas as nações; batizai-as em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Ensinai-as a observar tudo o que vos prescrevi. Eis que estou convosco todos os dias, até o fim do mundo”. (Mateus 28,18-20)

Fidelidade: Deus é fiel
- “Reconhece, pois, que o Senhor, teu Deus, é verdadeiramente Deus, um Deus fiel, que guarda a sua aliança e a sua misericórdia até a milésima geração para com aqueles que o amam e observam os seus mandamentos” (Dt 7,9);
- “Fiel é Deus, por quem fostes chamados à comunhão de seu Filho Jesus Cristo, nosso Senhor”. (1 Cor 1,9)
- “Jesus Cristo é sempre o mesmo: ontem, hoje e por toda a eternidade”. (Hebreus 13,8 )

Sacrifício: Deus se sacrifica por nós.
- “A minha vida, ninguém a tira de mim, mas eu a dou de mim mesmo e tenho o poder de a dar, como tenho o poder de a reassumir. Tal é a ordem que recebi de meu Pai.” (João 10,18)
- “Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a sua vida por seus amigos.” (João 15,13)
- “Eu vim para que todos tenham vida e para que a tenham em abundância.” (João  10,10)
 
Amor: Deus nos ama.
- “Nós conhecemos e cremos no amor que Deus tem para conosco. Deus é amor, e quem permanece no amor permanece em Deus e Deus nele”. (1 João 4,16).
- “Aquele que não ama não conhece a Deus, porque Deus é amor. Nisto se manifestou o amor de Deus para conosco: em nos ter enviado ao mundo o seu Filho único, para que vivamos por ele. Nisto consiste o amor: não em termos nós amado a Deus, mas em ter-nos ele amado, e enviado o seu Filho para expiar os nossos pecados.
Caríssimos, se Deus assim nos amou, também nós nos devemos amar uns aos outros”. (1 João 4,8-11)

A AMIZADE DO HOMEM COM DEUS

            Se Deus é esse amigo que dialoga, comunica-se, confia, é fiel, sacrifica-se, ama, somos chamados a aprender d’Ele a sermos seus amigos, imitando-o no seu modo de ser amigo. Santa Teresa, que viveu essa relação de amizade com Deus, pode nos ajudar a compreender melhor a nossa amizade com Deus

Carmelitas, amigos de Deus.

“.... Ele tem tantos inimigos e tão poucos Amigos ...(Santa Teresa, Caminho 1,2)

Quando, no Carmelo, falamos de amizade com Deus, nos vem a figura de Santa Teresa de Jesus, que cunha esta famosa definição sobre a oração, contida até mesmo no Catecismo da Igreja Católica:  “E outra coisa não é, a meu parecer, oração mental, senão tratar de amizade – estando muitas vezes tratando a sós - com quem sabemos que nos ama” (Vida 8,5).


CONSELHOS DE SANTA TERESA


Em relação à comunicação: “Procurai logo, filhas, pois estais sós, arranjar companhia. E que melhor que a do mesmo Mestre que ensinou a oração que ides rezar? Representai-vos o mesmo Senhor junto de vós e vede com que amor e humildade Ele vos está ensinando. E crede-me, enquanto puderdes, não estejais sem tão bom Amigo. Se vos acostumardes a trazê-lO ao pé de vós e Ele vir que o fazeis com amor e andais procurando contentá-lO, não podereis - como dizem - afastá-lO de  vós; nunca vos faltará; ajudar-vos-á em todos os vossos trabalhos; achá-lO-eis em toda a parte; e pensais que é pouco ter um tal Amigo a vosso lado?” ( Caminho 26,1)

Em relação ao conhecimento: “Quando chegardes a ele, refleti e procurai compreender com quem ides falar, ou com quem estais falando.Mil vidas das nossas não bastariam para acabarmos de entender como merece ser tratado este Senhor. Em sua presença tremem os anjos. Ele tudo governa, tudo pode. Seu querer é realizar. Sendo assim filhas, procuremos nos deleitar nessas grandezas de nosso Esposo, vendo com quem estamos desposas e que vida devemos levar com Ele.
            Valha-me Deus! Aqui na terra, quando alguém se casa, antes de tudo trata de indagar quem é o noivo, quais suas qualidades e seus haveres” (Caminho 2,7).

Em relação à confiança: “Já que o bom Jesus vos deu um Pai tão bom, nenhuma aqui conheça outro pai, para se entreter de grandezas. Procurai ser tais, minhas filhas, que mereçais lançar-vos nos braços desse Pai e gozar de sua confiança” (Caminho  27,6)
“Não penseis minhas irmãs que vos faltará o necessário por não contentardes as pessoas do mundo, isto vos asseguro. (...) Olhos fitos em vosso Esposo. Ele vos há de sustentar”. (Caminho 2,1)

Em relação à fidelidade: “... Não é justo que a este Senhor, que nos fez e continua fazendo tantos benefícios, não demos com toda determinação o tempo que resolvemos dar-lhe na oração” (Caminho 23,1).
“Voltando agora aos que o querem seguir sem parar, até o fim, até chegar a beber desta água de vida, direi como se há de principiar.  Importa muito, e acima de tudo, uma grande e firme determinação de não parar até chegar à fonte de água viva, venha o que vier, suceda o que suceder, custe o que custar, murmure quem murmurar, quer chegue ao fim, quer morra no caminho, ou falte coragem para os sofrimentos que nele se encontram. Ainda que o mundo venha abaixo, havemos que prosseguir” (Caminho 21,2)

Em relação ao sacrifício: “Torno a dizer que consiste tudo, ou grande parte, em perder o cuidado de nós mesmos e das nossas comodidades, pois, quem de verdade começa a servir ao Senhor, o menos que Lhe pode oferecer, é a vida. Se já lhe deu a sua vontade, que teme? Claro está que, se é verdadeiro religioso ou homem de oração e pretende gozar favores de Deus, não há de voltar costas ao desejo de morrer por Ele e sofrer martírio. Pois não sabeis, irmãs, que a vida do bom religioso, que quer ser dos amigos mais chegados de Deus é um longo martírio? Longo, porque, para comparar aos que de pronto eram degolados, pode-se chamar longo; mas toda a vida é curta e algumas curtíssimas. E que sabemos nós se a teremos tão curta, que na hora ou momento em que nos determinamos a servir de todo a Deus, logo se acaba? Seria possível; enfim, de tudo o que tem fim, não se deve fazer caso; e pensando que cada hora é a derradeira, quem não há de trabalhar? Pois, acreditai-me, que pensar isto é o mais seguro.” (Caminho 12,3)

Em relação ao amor: “Aqueles que deveras amam a Deus, amam tudo o que é bom, favorecem tudo o que é bom. Com os bons sempre se unem, ajudando-os e defendendo-os. Não prazem senão na verdade e no que é digno de ser amado. Pensais que as almas verdadeiramente enamoradas de deus possam amar as vaidades da terra, riquezas, deleites mundanos? Ou que tenham contendas e invejas? Não, é impossível.
            E o único motivo é porque não pretendem outra coisa senão contentar o Amado. Andam morrendo de desejo que Ele as ame. Vivem a buscar meios de Lhe serem mais agradáveis e de mais o amarem. (Caminho 40,3).
            O que aqui pretende o demônio não é pouco; é esfriar a caridade e o amor de umas para com as outras, o que seria grande dano. Entendamos, minhas filhas, que a perfeição verdadeira é amor de Deus e do próximo e, com quanto mais perfeição guardarmos estes dois mandamentos, seremos mais perfeitas. Toda a nossa Regra e Constituições não servem para outra coisa, senão de meios para guardar isto com mais perfeição. (Moradas I,2,17)

PARA REFLETIR E REZAR:

1) Como está a minha relação de amizade com Deus?
2) Eu reconheço Deus como O AMIGO?
3) Como tenho vivido com Deus os elementos essenciais da amizade: Comunicação, conhecimento, confiança, fidelidade, sacrifício, amor?
4) O que é necessário mudar na minha relação de amizade com Deus?

Frei José Cláudio de Alencar Batista, O. Carrm.

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